A logística é responsável por diminuir a
lacuna entre a produção e a demanda, fornecendo bens e serviços quando, onde e
na condição física que desejarem os consumidores (Ballou, 1993). O objetivo da
logística é planejar e coordenar as atividades necessárias para alcançar níveis
desejáveis de serviços e qualidade ao custo mais baixo possível (Christopher,
2001). Esta definição tradicional de logística empresarial vem sendo modificada
nos últimos anos. A preocupação de consumidores e governos com aspectos
ambientais tem premido as organizações a adotarem mecanismos logísticos que
garantam o recolhimento das embalagens dos seus produtos. Desta forma, o fluxo
de materiais ao longo dos canais de suprimento deixa de ser unidirecional (fornecedores
→ clientes) para se tornar bidirecional (fornecedores ↔ clientes). A exigência
dos consumidores por um nível de serviço mais elevado – que inclui as
preocupações ambientais – estaria fazendo com que as empresas implantassem e
investissem em atividades de logística reversa como fator de diferenciação e
fidelização dos clientes. Assim, a mudança na cultura de consumo dos clientes
estaria incentivando de forma importante a logística reversa. A maior
preocupação dos governos com esta questão reflete-se no desenvolvimento de legislação
adaptada aos modos de produção e consumo sustentáveis, que visem minimizar os
impactos das atividades produtivas ao meio ambiente. Exemplo disso foi a
elaboração da Resolução nº 258 do Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA
(BRASIL, 1999). A logística reversa tem conquistado maior importância e espaço
na operação logística das empresas, principalmente por seu potencial econômico.
Dentro dos principais processos envolvidos com a logística reversa, a
reciclagem é um dos mais importantes. Embora o potencial da atividade de
logística reversa na economia seja econômica e ambientalmente importante, a
falta de visão da atividade como geradora de vantagem competitiva às empresas
compromete a estruturação e a eficiência destes canais. Recentemente, como
forma de atenuar este problema, a maior empresa de reciclagem de alumínio do
Brasil se uniu a uma grande rede de hipermercados numa campanha para incentivar
a reciclagem de embalagens de bebidas. A expectativa das empresas era que a
instalação de Centros de Coleta deste tipo de embalagem nos hipermercados
geraria vantagens para ambas as organizações. A cadeia supermercadista
associaria sua imagem com a preservação ambiental. Assim, a pesquisa procurou
identificar se os clientes desta rede de hipermercados reconhecem os Centros de
Coleta, fazem uso dos centros e, principalmente, se a presença deles os
estimula a frequentar o estabelecimento. Para isso, foi realizada uma pesquisa
com 115 clientes de três lojas desta rede de hipermercados. As lojas
pesquisadas estavam localizadas no Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo.
A
pesquisa se caracteriza de natureza qualitativa e exploratória. Utilizando para
isso o estudo de caso em uma rede hipermercadista que se uniu à maior empresa
de reciclagem de alumínio do Brasil na instalação de Centros de Coleta nos
hipermercados. Conceituação e
caracterização da logística reversa: Na década de 80, o conceito de
logística reversa ainda estava limitado a um movimento contrário ao fluxo
direto de produtos na cadeia de suprimentos. Foi nos anos 90 que novas
abordagens foram introduzidas e o conceito evoluiu impulsionado pelo aumento da
preocupação com questões de preservação do meio ambiente. O Conselho de
Profissionais de Gestão da Cadeia de Suprimentos definiu logística reversa como
“um segmento especializado da logística que foca o movimento e gerenciamento de
produtos e materiais após a venda e após a entrega ao consumidor. Inclui
produtos retornados para reparo e/ou reembolso financeiro”. Já Rogers e
Tibben-Lembke (1998, p. 2) definem logística reversa como: [...] o processo de
planejamento, implementação e controle da eficiência e custo efetivo do fluxo
de matérias-primas, estoques em processo, produtos acabados e as informações
correspondentes do ponto de consumo para o ponto de origem com o propósito de
recapturar o valor ou destinar à apropriada disposição. A logística reversa é
uma atividade ampla que envolve todas as operações relacionadas com a
reutilização de produtos e materiais como as atividades logísticas de coleta,
desmonte e processo de produtos e/ou materiais e peças usadas a fim de
assegurar uma recuperação sustentável deles e que não prejudique o meio
ambiente (REVLOG, 2005). Para que haja um fluxo reverso, existe um conjunto de
atividades que uma empresa pode realizar ou terceirizar. Entre estas atividades
encontram-se a coleta, separação, embalagem e expedição de itens usados,
danificados ou obsoletos dos pontos de venda (ou consumo) até os locais de
reprocessamento, reciclagem, revenda ou descarte (Steven, 2004). A análise dos
produtos e materiais tem a função de definir seu estado e determinar o processo
ao qual deverá se submeter. O foco de atuação da logística reversa envolve a
reintrodução dos produtos ou materiais na cadeia de valor pelo ciclo produtivo
ou de negócios. Portanto, o descarte do produto deve ser a última opção a ser
analisada. Pela gestão do fluxo reverso de produtos e/ou informações, a
logística reversa integra os canais de distribuição reversos. Leite (2003, p.
4) define os canais de distribuição reversos como: [...] as etapas, as formas e
os meios em que uma parcela desses produtos, com pouco uso após a venda, com
ciclo de vida útil ampliado ou após extinta a sua vida útil, retorna ao ciclo
produtivo ou de negócios, readquirindo valor em mercados secundários pelo reuso
ou reciclagem de seus materiais constituintes. Observa-se que a logística
reversa de pós-venda, em conjunto com a de pós-consumo, propicia benefícios à
imagem corporativa, competitividade e redução de custos da empresa. O canal de
distribuição reverso de pós-consumo se caracteriza por produtos oriundos de
descarte após uso e que podem ser reaproveitados de alguma forma e, somente em
último caso, descartados. Já o canal de distribuição reverso de pós-venda se
caracteriza pelo retorno de produtos com pouco ou nenhum uso que apresentaram
problemas de responsabilidade do fabricante ou distribuidor ou, ainda, por
insatisfação do consumidor com os produtos (Rogers e Tibben-Lembke, 1998). Diversas
podem ser as razões para que um produto retorne pela cadeia de suprimentos,
tais como: defeito, falta de atendimento às expectativas, erro de pedidos,
excesso de estoque, danificação ou contaminação do produto e produtos fora de
linha. Como a logística reversa de pós-venda, a atividade relacionada ao
pós-consumo também possui vantagens econômicas para a empresa que a utiliza.
Leite (2003) afirma que o objetivo econômico de implantação da logística
reversa de pós-consumo se deve às economias relacionadas com o aproveitamento
das matérias-primas secundárias ou provenientes de reciclagem, bem como da
revalorização dos bens pela reutilização e reprocesso. Diferentemente do canal
de pós-venda, de justificativa eminentemente econômica, o retorno de bens
usados também tem justificativa ligada às questões ambientais e legais. Assim
sendo, esta atividade é mais significativa em sociedades mais preocupadas com
este tema, nas quais, via de regra, a legislação ambiental é mais rígida. A utilização da logística reversa como
fator gerador de vantagem competitiva - As bases de vantagens competitivas
duradouras e sustentáveis residem em diferenças no comportamento estratégico de
uma empresa e de seus concorrentes. A estratégia de uma empresa pode ser vista
como sendo “a busca deliberada de um plano de ação para desenvolver e ajustar a
vantagem competitiva...” (Henderson, 1998, p. 5). Assim, uma empresa deve ser
capaz de criar e operacionalizar estratégias que as diferenciem de seus
concorrentes e as habilitem para a obtenção de vantagens competitivas
sustentáveis e defensáveis a longo prazo. Conhecer os fatores de sucesso é
essencial para que isso possa acontecer. A diferenciação de produtos e serviços
é uma estratégia importante para a criação de vantagem competitiva. Diferenciar
um produto ou serviço significa torná-lo especialmente adaptado a um segmento
de consumo, o qual estaria pronto a pagar mais para obtê-lo ou, ainda,
utilizá-lo mais intensivamente (Kotler e Armstrong, 1998). A diferenciação dos
serviços logísticos, agregando valor ou atendendo às necessidades de clientes
com preocupações específicas, é uma forma importante de uma empresa obter
vantagem competitiva. A logística contribui para o sucesso das organizações não
somente por propiciar aos clientes a entrega de produtos ou serviços nos
padrões de tempo e espaço demandados, mas também por promover suporte ao
produto após sua venda ou consumo. A logística reversa pode ser utilizada
estrategicamente para permitir aos participantes do elo seguinte ao
processamento na cadeia, tais como varejistas e atacadistas, reduzir o risco de
comprar produtos que podem não ter vendas no período de tempo julgado
conveniente. O uso estratégico da capacidade de logística reversa aumenta os
custos de mudança de fornecedores. O aumento no nível de serviço proporcionado
por esta atividade fortalece a cadeia de valor de uma empresa que, se bem
configurada, reforça sua vantagem competitiva (Chaves, 2005). Para ser
visualizada e compreendida, a vantagem competitiva não pode ser analisada sob o
ponto de vista da empresa como um todo. Ela se origina em atividades
segmentadas como produção, projeto, marketing, logística, dentre outras. Cada
atividade é fonte potencial de vantagem competitiva para a empresa. A logística
reversa, por perpassar várias destas funções, pode ser responsável por
vantagens competitivas ligadas mais ou menos profundamente a cada uma delas. De
acordo com alguns autores (Rogers e Tibben-Lembke, 1998; Leite, 2003, Steven,
2004, Chaves, 2005), são exemplos de vantagens competitivas que podem ser
obtidas pela adoção de políticas e instrumentos de logística reversa: Restrições
ambientais: A logística deve procurar a minimização do impacto ambiental, não
só dos resíduos oriundos das etapas de produção e do pós-consumo, mas dos
impactos ao longo do ciclo de vida dos produtos; Redução de custo: O
reaproveitamento de materiais e a economia com embalagens retornáveis fornecem
ganhos que estimulam novas iniciativas e esforços em desenvolvimento e melhoria
dos processos de logística reversa; Razões competitivas: Uma forma de ganho de
vantagem competitiva frente aos concorrentes é a garantia de políticas liberais
de retorno de produtos que fidelizem os clientes. Empresas que possuem um processo
de logística reversa bem gerido tendem a se sobressair no mercado, uma vez que
podem atender aos seus clientes de forma melhor e diferenciada do que seus
concorrentes; e diferenciação da imagem corporativa: Muitas empresas estão
utilizando logística reversa estrategicamente e se posicionando como
empresa-cidadã, contribuindo com a comunidade e ajudando as pessoas menos
favorecidas. O comportamento do
consumidor e a escolha do local de compra - Watson (1913, p. 159) definiu
comportamento como “o conjunto das reações ou respostas que um organismo
apresenta às estimulações do ambiente”. Apesar da definição simples, o estudo
do comportamento do consumidor abrange uma grande variedade de disciplinas
inter- relacionadas caracterizadas pela complexidade de seus conteúdos. No
entanto, para esta pesquisa é relevante destacar em qual etapa de um modelo
clássico de comportamento do consumidor a escolha do local de compra insere-se.
Segundo Kotler (2000, p. 182), os estímulos de marketing associados a outros
estímulos do ambiente, influenciam as pessoas no processo de decisão de compra,
o qual está fortemente relacionado às características do comprador. Para
escolher o local de compra, o cliente busca informações que o auxiliem na
decisão de forma a minimizar o risco de insatisfação. Estas informações podem
ser fornecidas por atividades promocionais pelo próprio varejista sobre as
características do ponto de venda, por questões econômicas como renda familiar,
dentre outras. No entanto, alguns autores (Engel et al., 2000; Moura, 2005)
afirmam que a imagem da loja é um dos fatores que mais influenciam o consumidor
na escolha de uma loja para compra. Solomon (1999) e Peter e Olson (1999)
apresentaram um modelo básico de decisão de compra do consumidor que envolve as
seguintes etapas: reconhecimento do problema; busca de informação; avaliação de
alternativas; compra; e pós-compra. A natureza desse processo decisório envolve
as opções de compra, opções de consumo e opções de descarte. Engel et al.
(2000) também adicionam ao modelo as etapas de consumo e descarte, que seriam
as últimas etapas do processo decisório do consumidor. Ante todo o exposto, os
autores constataram que a logística
reversa não é um fator de influência na decisão sobre o local de compra.
Outros fatores como proximidade, preço e variedade dos produtos prevalecem nesta
escolha. Concluíram, também, através dos dados levantados, que os clientes do
hipermercado não reconhecem a coleta de embalagens como um serviço
diferenciado. Portanto, é difícil que o fluxo nas lojas tenha aumentado e que
os clientes tenham se tornado mais fiéis em função da campanha empreendida
pelas empresas. A existência de um sistema logístico reverso não é um elemento
qualificador e, sim, uma atividade ganhadora de pedido, pois ele oferece um
serviço específico que, muitas vezes é determinante na escolha do fornecedor.
No entanto, para a campanha de incentivo à reciclagem de embalagens ser mais
eficiente e abrangente é necessário que a rede de hipermercados e a empresa
recicladora despendam um maior esforço na divulgação dos Centros de Coleta e na
motivação dos seus clientes para a campanha. Como implicações gerenciais, a
pesquisa dos autores considera que as empresas podem alcançar uma vantagem
competitiva sustentável por diferenciação da imagem da empresa e de redução de
custos. Porém este processo deve ser acompanhado por fortes incentivos de
promoção, para contribuir para os resultados esperados na concepção da
logística reversa. Este tipo de campanha é susceptível à conscientização por
parte dos consumidores, bem como de sua percepção das vantagens em participar
dela.
CHAVES, Gisele de Lorena Dinz; BATALHA, Mário Otávio. Os consumidores valorizam a coleta de embalagens recicláveis? Um estudo de caso da logística reversa em uma rede de hipermercados. Gestão e Produção. v.13, n.3, p.423-434, set.-dez. 2006
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